Autores: Elton Gloeden, Fernanda Tanure, Márcia Duarte e André Silva Oliveira

1. Introdução

Conforme ocorrido em diversos países e no Brasil, incluído o Estado de São Paulo, antes da implementação de legislações específicas sobre o Gerenciamento de Áreas Contaminadas (GAC) foram utilizadas legislações sobre outros assuntos para tratar dessa questão, como as relativas a resíduos sólidos, licenciamento ambiental, recursos hídricos e uso e ocupação do solo.

No contexto brasileiro, a legislação específica sobre o GAC foi estabelecida inicialmente no Estado de São Paulo, com a publicação da Lei Estadual nº 13.577/2009, a qual foi a base para a elaboração posterior da legislação federal sobre o assunto, representada pela Resolução CONAMA nº 420/2009, além de ter sido referência para a elaboração de resoluções, portarias, deliberações ou instruções técnicas implantadas em outros Estados, como, por exemplo, em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Espírito Santo (ver Seção 2.3).

Cabe ser destacado que, para a elaboração da legislação específica sobre GAC no Estado de São Paulo, houve forte influência da legislação estadunidense, especialmente a Lei do “Superfund” de 1980 (ver Seção 2.4), além da legislação alemã, representada pela Lei “Bundes-Bodenschutzgesetz” de 1998 (ver Seção 2.5).

2. Adequação da Legislação Federal e Paulista à Constituição Federal e à Política Nacional de Meio Ambiente

Como mencionado, o GAC é um procedimento técnico e administrativo previsto na legislação ambiental federal, por meio da Resolução CONAMA nº 420/2009 e na legislação do Estado de São Paulo, especialmente pela Lei Estadual nº 13.577/2009 e pelo Decreto Estadual nº 59.263/2013.

Tal procedimento estadual, ao estabelecer em seus artigos 6º e 7º que qualquer pessoa física ou jurídica, e o Poder Público, devem atuar de forma preventiva e corretiva para evitar alterações significativas das funções do solo, se coaduna com o texto constitucional, na medida em que, no artigo 225, é imposto ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações, garantindo-se seu equilíbrio ecológico.

Assim, havendo a identificação de uma Área Contaminada (AC) (ver conceito na Seção 1.2), o Poder Público deve agir ativamente perante os responsáveis legais para que haja a recuperação ambiental de modo a permitir o uso seguro da área; bem como, de forma preventiva, deve o Poder Público estabelecer regras para evitar a ocorrência de novas ou mesmo a continuação de contaminações, e também instituir mecanismos de controle das áreas potencialmente geradoras de áreas contaminadas. Nesse cenário, ao dispor sobre diretrizes e procedimentos para a execução do GAC, a Lei Estadual nº 13.577/2009 estabelece regras específicas e padronizadas para que seja possível, dentre outras determinações, a “recuperação da qualidade ambiental”.

A Lei Estadual nº 13.577/2009 também está em consonância com a Lei Federal nº 6.938/1981, que estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente e tem por objetivo, conforme o seu artigo 2º, a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos dez princípios listados em seus incisos. Dentre os princípios indicados, destaca-se o inciso VIII, da recuperação de áreas degradadas (dentre elas, as contaminadas).

A regulamentação do inciso VIII do artigo 2º da Lei Federal nº 6.938/1981 é dada pelo Decreto Federal nº 97.632/1989, em especial o artigo 3º, o qual esclarece que o objetivo da recuperação de áreas degradadas é o retorno “a uma forma de utilização, de acordo com um plano preestabelecido para o uso do solo, visando à obtenção de uma estabilidade do meio ambiente”.

Em adição, para as atividades que exploram recursos minerais, o §2º do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, determina que essas são obrigadas a recuperar o meio ambiente com a solução técnica definida pelo órgão competente.

Portanto, considerando que a Lei Estadual nº 13.577/2009 e o Decreto Estadual nº 59.263/2013, assim como a Resolução CONAMA nº 420/2009, estabelecem procedimentos específicos para recuperação ambiental de áreas contaminadas, os quais culminam na reabilitação dessas áreas para o uso declarado, aprovado pelo órgão ambiental, conforme citado no artigo 26 da Lei Estadual nº 13.577/2009 e no artigo 36 da Resolução CONAMA nº 420/2009, tais normas estão de acordo com os textos constitucional e legais federais.

3. Procedimento de Gerenciamento de Áreas Contaminadas

Em resumo, o objetivo geral do GAC é identificar e conhecer as características das Áreas Contaminadas (AC), visando implementar as medidas necessárias para a sua reabilitação.

Conforme estabelecido na Lei Estadual nº 13.577/2009 e no Decreto Estadual nº 59.263/2013, tanto nas situações nas quais são identificados danos aos bens a proteger, quanto nas situações em que são identificados riscos potenciais acima dos níveis aceitáveis aos bens a proteger, durante a execução das etapas do GAC, devem ser implementadas medidas de intervenção com o objetivo de se permitir o uso seguro da área. Ou seja, basta a identificação de risco potencial acima do nível aceitável a um bem a proteger para que as medidas de intervenção sejam deflagradas. Sendo assim, depreende-se que as medidas de intervenção devem ser executadas mesmo quando não for identificado um dano a um bem a proteger. Tais medidas devem ser propostas pelo responsável legal e responsável técnico e aprovadas pelo órgão ambiental gerenciador.

Analisando-se o histórico do Cadastro de Áreas Contaminadas e Reabilitadas do Estado de São Paulo, verifica-se que, na grande maioria dos casos, as medidas de intervenção propostas para as AC foram implementadas em razão da identificação de riscos potenciais acima dos níveis aceitáveis aos bens a proteger, sendo esses, principalmente, riscos relacionados à saúde humana.

Por outro lado, na minoria dos casos, as medidas de intervenção foram propostas ou implementadas devido à ocorrência de danos aos bens a proteger, incluindo óbitos em razão de explosões, ou pela constatação da degradação da qualidade das águas subterrâneas de partes de aquíferos utilizados para abastecimento.

Essa análise demonstra que a abordagem utilizada no GAC possui preponderantemente caráter preventivo, uma vez que, na maioria dos casos, as medidas de intervenção são adotadas com o objetivo de se evitar a ocorrência de danos aos bens a proteger.

Bem ainda, o GAC se mostra como um procedimento sustentável, pois a implementação das medidas de intervenção também visa atingir, de forma equilibrada, a melhor solução ambiental possível, economicamente viável e que proporcione benefícios sociais e culturais, além da revitalização de regiões degradadas.

Dessa forma, o GAC, normalmente é acompanhado em processo administrativo coordenado pelo órgão ambiental gerenciador, o qual exige do responsável legal o atendimento às exigências técnicas. O responsável legal, por sua vez, deve designar um responsável técnico para executar as etapas do GAC necessárias para o caso.