Há um certo mistério sobre a mente humana que certamente os profissionais que a estudam sabem nos explicar. Sempre que se busca incessantemente uma resposta que teima em não aparecer, ela acaba sendo mostrada em sonho. Foi exatamente o que aconteceu ao célebre Químico russo- siberiano Dmitr Mendeleev no longínquo 17 de fevereiro de 1869, há exatos 150 anos.

Mas quem era essa figura de longas barbas e cabelo desgrenhado, como se cada fio tivesse vida própria e se comportasse individualmente, em total desconhecimento aos demais? Um apaixonado e incansável estudioso dedicado à compreensão dos mistérios da Ciência. Jamais um xamã ou gnomo como sua figura sugeria, mas um professor genial, convicto e sobretudo entusiasmado, sucesso absoluto entre os estudantes da Universidade de São Petresburgo onde fora nomeado para a cátedra de Química Geral aos 32 anos de idade, depois de lecionar Química no Instituto Técnico da mesma cidade russa.

Naquele invernal fevereiro de 1869 Mendeleev, depois de ter concluído em 60 dias as mais de 500 páginas de seu manual de Química Orgânica, estava dedicado à compreensão do padrão entre os até então conhecidos elementos químicos, pois disso necessitava para concluir seu livro sobre a Química Inorgânica. Já sabia que eles podiam ser reunidos em grupos de propriedades semelhantes e ordem ascendente de “pesos atômicos” como os halógenos (F-19, Cl-35, Br-80, I-127), o grupo do oxigênio (O-16, S-32, Se-79, Te-128) e o grupo do nitrogênio (N-14, P-41, As-75, Sb-122) mas este padrão só se aplicava a pouco mais que uma dúzia de elementos, o mesmo não acontecendo com os mais de 50 restantes. À época a comunidade científica internacional já tinha esse conhecimento.

Para Mendeleev, que via na Lei da Gravidade de Newton e na teoria da Evolução das Espécies de Darwin os  padrões imutáveis da Física e da Biologia, era inaceitável que na Química uma situação semelhante não se manifestasse, isso para ele não era científico.

Consecutivamente, por três dias e três noites, entre 14 e 17 de fevereiro daquele 1869 Mendeleev se debruçou de forma incansável sobre a questão dos elementos químicos. Exausto porém tomado pelo sentimento de estar prestes a alcançar uma espetacular descoberta, a certa hora Mendeleev debruçou-se sobre sua mesa de trabalho, adormeceu e teve um sonho. Mais tarde afirmou “Vi num sonho uma tabela em que todos os elementos se encaixavam como requerido. Ao despertar, escrevi-a imediatamente em uma folha de papel.” Nesta a que ele chamou Tabela Periódica dos Elementos estes são listados na ordem crescente de seus “pesos atômicos”, sendo suas propriedades repetidas em intervalos periódicos.

Estava aí descoberto o padrão que colocava a Química ao lado da Física e da Biologia, como uma Ciência que enfim chegara à maioridade. Mendeleev chegou inclusive a prever a descoberta de alguns elementos químicos, que viriam a se encaixar em espaços ainda não devidamente preenchidos de sua tabela periódica.

Muitos foram os avanços alcançados pela Química desde a proposição da Tabela Periódica dos Elementos que, apesar de tudo, continua sendo a base da Química Moderna. Nas palavras do ex presidente da Sociedade Brasileira de Química – SBQ, Prof. Carlos Alberto Filgueiras, químico e historiador da ciência da Universidade Federal de Minais Gerais (UFMG), “Hoje a tabela periódica pode ser considerada a enciclopédia mais concisa que existe. Quem sabe usá-la encontra muitas informações em uma única folha de papel. Não existe nada igual em outra área do conhecimento.”

Hoje os 118 elementos químicos conhecidos estão dispostos na  Tabela Periódica na ordem crescente de número atômico (quantidade de prótons em seu núcleo) em sete linhas horizontais, mais duas adicionais para os derivados do Lantânio-57 e Actínio-89, e dezoito colunas verticais onde se reúnem aqueles com propriedades semelhantes. Este é o modelo oficial da União Internacional de Química Pura e Aplicada – IUPAC e o mais difundido, existindo  entretanto outros alternativos menos utilizados.

Em justa homenagem a Mendeleev o elemento químico de número atômico 101, descoberto em 1955 na Universidade de Berkeley- Califórnia, recebeu o nome de Medelévio (Md). Neste 2019, 150 anos após a fantástica descoberta,  a Organização da Nações Unidas estabeleceu o Ano Internacional da Tabela Periódica, comemorado no mundo inteiro pelas comunidades acadêmicas e científicas e na CETESB através do Fórum de Químicos da Empresa.

Bibliografia

Strathern, Paul – O Sonho de Mendeleiev, Zahar ,2002
A Encruzilhada da Tabela Periódica, Revista FAPESP, ed.277, mar.2019