Os mais recentes relatórios (AR4, AR5 e AR6) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, 2007; 2014; 2023) apresentam estudos que retratam, de maneira irrefutável, que as mudanças climáticas globais estão associadas ao aumento da emissão de gases de efeito estufa consequentes das ações antropogênicas, e que essas alterações climáticas já vêm causando impactos ao meio ambiente, economia, saúde, segurança hídrica e bem-estar da sociedade em geral.
Nesses relatórios, reforça-se ainda que além de um aprofundamento nos estudos sobre riscos e impactos climáticos, há, sobretudo, uma necessidade premente de se reconhecer o estado de emergência climática, e que os esforços devem se concentrar principalmente na pesquisa e desenvolvimento de ações de adaptação dos territórios às mudanças do clima, na direção de torná-los mais resilientes — sobretudo em áreas mais expostas e potencialmente suscetíveis aos riscos climáticos, como, no caso, os locais de maior vulnerabilidade socioeconômica e ambiental, tais como as ocupações em áreas de risco geológico, expostas a desastres naturais, como deslizamentos, inundações, etc.
Destaque-se ainda, que modelos e cenários climáticos futuros, amplamente abordados pela literatura científica nas últimas décadas, já vêm indicando uma tendência de aumento na frequência de eventos climáticos extremos de natureza diversa (secas, ondas de calor, chuvas extremas, vendavais, ressacas, etc.), e que isso já vêm também movimentando a sociedade e os governos a agirem, não apenas em função dos prejuízos já causados, mas principalmente pelo grande desafio ainda a ser enfrentado, incluindo-se a necessidade de ações integradas entre os diversos setores da sociedade, fundamentadas no pleno conhecimento dos cenários atuais e previstos.
Faz-se necessário, portanto, dado o estado de emergência climática e da urgência da necessidade de adequação à essa nova realidade, de uma compreensão plena sobre o risco climático, como elemento-chave para que se tenha um adequado planejamento (calcado na construção de uma nova e estratégica visão territorial, incluindo a adoção de medidas de adaptação a novos cenários climáticos), visando a resiliência e capacidade adaptativa de territórios e suas populações. Sob essa ótica, a difusão de conhecimento dos impactos das mudanças climáticas sobre os recursos hídricos torna-se um elemento fundamental a fim de tornar os municípios mais resilientes e dotados de capacidade adaptativa, minimizando-se, consequentemente, os prejuízos humanos, materiais e ambientais.
O papel da CETESB
A CETESB, desde 1995, vem oferecendo suporte às ações de implementação dos compromissos oriundos dos acordos internacionais estabelecidos na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) (BRASIL, 1998), atuando na coordenação de programas estaduais, na elaboração de inventários nacionais e estaduais, e na aplicação da Política Estadual de Mudanças Climáticas (PEMC) (SÃO PAULO, 2009), tendo sido a responsável pela coordenação técnica do Inventário de Emissões Antrópicas de Gases de Efeito Estufa Diretos e Indiretos do Estado de São Paulo (CETESB, 2011). Além disso, a CETESB tem colaborado na formulação, implementação, publicação e atualização de programas regionais que incluam medidas para mitigar a mudança do clima, além de estipular critérios para a elaboração de inventários corporativos de emissões de gases de efeito estufa (GEE) de segmentos específicos da indústria no Estado de São Paulo, uma iniciativa pioneira na América Latina quanto à coleta e armazenamento de dados.
Durante esse período, a CETESB também tem realizado diversos cursos e capacitações sobre a temática das mudanças climáticas e afins, direcionados tanto ao público externo como internamente. Mais recentemente, após a publicação dos últimos relatórios do IPCC, quando as abordagens sobre adaptação climática tornaram-se mais efetivas e viáveis, a CETESB também passou a atuar nesse segmento específico, que considera principalmente a viabilidade, eficácia e potencial das medidas de adaptação às mudanças climáticas, bem como seus cobenefícios para a saúde humana, economia e meio ambiente. A capacitação técnica para identificação de vulnerabilidades e proposição de medidas adaptativas surgiu justamente em função dessa busca pelo desenvolvimento de um projeto sobre adaptação, visando incluir, não apenas o estudo das vulnerabilidades e o desenvolvimento de políticas e estratégias para o avanço do conhecimento e aprendizagem, mas pincipalmente, preparar municípios e/ou regiões envolvidas para a identificação e redução de riscos, para que isso pudesse contribuir para um adequado planejamento e implantação de medidas adaptativas, locais e regionais.
Capacitação em Adaptação às Mudanças Climáticas
Reforçando o compromisso e o protagonismo do Estado de São Paulo frente aos impactos das mudanças climáticas, a CETESB vem desenvolvendo um projeto de capacitação técnica para identificação do risco climático e proposição de medidas adaptativas, tendo-se em vista a prevenção dos efeitos das mudanças climáticas sobre os recursos hídricos, e utilizando-se para tanto da tomada de recursos do Fundo Estadual de Recursos Hídricos (FEHIDRO) — enquadramento no PDC 8 de Capacitação e Comunicação social, na categoria 8.1 de Capacitação Técnica Relacionada ao Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos – conforme previsto nos Arts. 17 e 25 da PEMC (SÃO PAULO, 2009).
O curso tem como objetivo principal capacitar agentes públicos, municipais e estaduais, e representantes da sociedade civil, por meio de conceitos teóricos e dinâmicas participativas, proporcionando aos participantes: a identificação dos riscos climáticos (a partir das ameaças, exposição e vulnerabilidades socioambientais) locais e regionais, a construção conjunta das medidas de adaptação necessárias (culminando com o desenvolvimento de projetos e/ou ações adaptativas passíveis de implantação), e a facilitação ao acesso às fontes de financiamento para implementação desses projetos.
Por meio de uma metodologia pré-estabelecida (visando o melhor aproveitamento possível do público-alvo, considerando-se a realização de treinamentos presenciais e remotos, síncronos e assíncronos, e valendo-se de metodologias que sejam integradoras e participativas), e fundamentada em um conteúdo programático específico (material base para consulta, pesquisa e treinamento do público-alvo durante a capacitação), o projeto tem se estabelecido como um modelo, podendo ser aplicado em qualquer uma das 22 Unidades de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Estado de São Paulo (UGRHIs), utilizando-se para tanto da estrutura já estabelecida pelos comitês de bacias hidrográficas, e considerando-se, em cada um dos casos, as especificidades e realidades locais e regionais.
O projeto já foi realizado na região da Baixada Santista (UGRHI-7) entre 2019 e 2021, e atualmente, em 2024, encontra-se em curso na região do Alto Tietê (UGRHI-6). Em ambos os casos, o público-alvo da capacitação reuniu representantes regionais, participantes (diretos ou indiretos) dos respectivos comitês de bacia hidrográfica, agentes municipais, e representantes do Estado e da sociedade civil, e foram direcionados a regiões de extrema vulnerabilidade às mudanças climáticas, seja no caso da Baixada Santista, seja no caso do Alto Tietê.
Para saber mais:
BRASIL. Decreto n. 2.652, de 1 de julho de 1998, Promulga a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, assinada em Nova York, em 9 de maio de 1992. Diário Oficial da União, Brasília, Seção 1, p. 6, 2 jul. 1998 (publicação original). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d2652.htm.
_______. Ministério do Meio Ambiente. Portaria n. 150, de 10 de maio de 2016, Institui o Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, n. 89, Seção 1, p.131-132, 11 mai. 2016a. Disponível em: https://antigo.mma.gov.br/images/arquivo/80182/Portaria%20PNA%20_150_10052016.pdf.
_______. Ministério do Meio Ambiente. Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima: Sumário Executivo. Brasília: MMA, 2016b. Disponível em: https://www.gov.br/mma/pt-br/assuntos/climaozoniodesertificacao/pna_sumario_executivo.pdf.
CETESB. Inventário de emissões antrópicas de gases de efeito estufa diretos e indiretos do Estado de São Paulo, 01. São Paulo: CETESB, 2011, 1 ed. / São Paulo: CETESB, 2011, 2 ed. Disponível em: https://cetesb.sp.gov.br/inventario-gee-sp/wp-content/uploads/sites/34/2014/01/Primeiro_Inventario_GEE_WEB_Segunda-Edicao-v1.pdf.
_______. Resultados da Capacitação em adaptação às mudanças climáticas sobre os recursos hídricos na Baixada Santista. São Paulo: CETESB, 2022. Disponível em: https://cetesb.sp.gov.br/wp-content/uploads/2022/05/Resultados-da-Capacitacao-em-Adaptacao-as-Mudancas-Climaticas_web1.pdf.
IPCC. AR4 Climate change 2007: Synthesis report. Genebra: IPCC, 2007. Disponível em: https://www.ipcc.ch/site/assets/uploads/2018/02/ar4_syr_full_report.pdf.
_______. AR5 Climate change 2014: Synthesis report. Genebra: IPCC, 2014. Disponível em: https://www.ipcc.ch/site/assets/uploads/2018/02/SYR_AR5_FINAL_full.pdf.
_______. AR6 Climate change 2023: Synthesis report. Genebra: IPCC, 2023. Disponível em: https://www.ipcc.ch/report/ar6/syr/downloads/report/IPCC_AR6_SYR_FullVolume.pdf.
SÃO PAULO (Estado). Lei Estadual n. 13.798, de 09 de novembro de 2009, Institui a Política Estadual de Mudanças Climáticas – PEMC. Diário Oficial do Estado de São Paulo. São Paulo, v. 119, n. 209, seção I, p. 1-4, 10 nov. 2009. Disponível em: https://www.al.sp.gov.br/norma/158351.
_______. Decreto Estadual n. 68.308, de 16 de janeiro de 2024, Regulamenta a Lei Estadual n. 13.798, de 9 de novembro de 2009, que dispõe sobre a Política Estadual de Mudanças Climáticas, reorganiza o Conselho Estadual de Mudanças Climáticas e o Comitê Gestor da Política Estadual de Mudanças Climáticas, e dá providências correlatas. Diário Oficial do Estado de São Paulo. São Paulo, v. 134, n. 12, seção I, p. 3, 17 jan. 2024. Disponível em: https://www.al.sp.gov.br/norma/209079.